Os Experimentos do Capital

Daniel Hilário
3 min readSep 18, 2021
Protesto em memória do músico Evaldo do Santos, morto em ação do Exército na região da Vila Militar, na Zona Oeste do Rio, em 7 de abril de 2019. Foto de Mauro Pimentel / AFP.

Foi ano passado, mas poderia ser na década de 1930. Mais uma vez, em nome da ciência, um grupo de pessoas é submetido (ou não, explico abaixo) a um tratamento que, supostamente, lhe faria bem, mas que, ao final, somente trouxe morte.

Dessa vez, o que se diz é que, com a anuência do Poder Público, vários idosos foram feitos de cobaias, sendo submetidos a tratamentos experimentais, sem comprovação científica e sem o seu conhecimento e concordância; médicos foram forçados a mudar prescrições, e, a cada uma que agradasse a uma cúpula, seria contabilizada em uma meta; resultados de uma suposta pesquisa foram fraudados e alardeados, em altos brados, em redes sociais e na mídia, de forma a reforçar uma narrativa fantasiosa e macabra.

Mas nada disso é novo. Pelo contrário, na sociedade do capital estes experimentos se repetem diuturnamente, sob a pecha de se estar atuando em nome da ciência. Não deixei de me lembrar do experimento ocorrido nos Estados Unidos, nos citados anos de 1930, em que, sistematicamente, foi negado o tratamento de sífilis para centenas de homens negros no Alabama.

Porém, tal negativa não foi explícita, pelo contrário: Sem conhecimento, cerca de 400 negros passaram pelo procedimento conhecido como “Estudo de Sífilis de Tuskegee”, em que recebiam remédios se efeito, e não eram informados que haviam contraído sífilis.

Em 1932, o serviço de saúde estadunidense começou um programa para acompanhar a progressão de tal doença, e, para tanto, recrutou 600 homens negros com a promessa de acompanhamento médico gratuito, alimentação, transporte e assistência funeral.

No entanto, os 399 infectados recebiam apenas a informação de que tinham sangue ruim. Ainda, eram-lhes ministradas pílulas e doses de xaropes, o que daria a crer que eles recebiam, efetivamente, algum tipo de tratamento. Porém, tratava-se apenas de placebo, sem qualquer princípio ativo que pudesse combater a sífilis.

Um detalhe: tal “estudo” foi feito em um dos locais mais pobres do Alabama, ou seja, tanto lá, como cá, escolheu-se uma população vulnerável e frágil, que muitas vezes é vista como descartável aos olhos do público (se naquela época estávamos no auge das políticas de segregação racial, hoje se tem a cultura hedonista da eterna juventude, o que traz a impressão de que a velhice seria um fardo).

Na situação ocorrida no século XX, a verdade só veio à lume na década de 1970, após denúncia pela imprensa. Isso 40 anos após o início do “estudo”, o que gerou um processo de 9 milhões de dólares. Houve um pedido oficial de desculpas em 1997 por parte do governo estadunidense, momento em que apenas 8 participantes ainda estavam vivos.

Na situação, supostamente, ocorrida em 2020, espera-se que o rigor da lei seja aplicado, vez que, para além das situações indicadas acima, a prescrição de remédios incapazes de combater a Covid-19 seguiu acontecendo, mesmo após a divulgação de notas e recomendações contraindicando seu uso.

Uma dica, que serve para a maioria dessas situações: Sigam o dinheiro.

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Referências:

https://www.cartacapital.com.br/saude/caso-prevent-senior-e-o-maior-escandalo-medico-da-historia-do-brasil/

https://reporterbrasil.org.br/2021/09/prevent-senior-e-hapvida-seguem-receitando-kit-covid-apos-comprarem-5-milhoes-de-caixas-de-cloroquina-e-ivermectina/

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