Você não está mais aqui. (Tudo bem)

Ao menos para mim, o luto é algo difícil de elaborar. Isso porque, se considerarmos que a morte é uma mera consequência de viver, então tem de ser vista com naturalidade. Mas nunca é fácil.
Sempre tivemos nossos embates, nossas conversas, nossos desacertos. Porém, tudo foi com o máximo de respeito, tanto de mim para ti, ou de ti para mim.
Você dizia que eu não sabia nada, e que era muito novo. Também pudera, sou 58 anos mais jovem. Mas, mesmo assim, vinha a mim perguntar quando tinha dúvidas. E me crivava com suas histórias de vida, da sua infância na fazenda à oportunidade (infelizmente perdida) de ir para o Rio de Janeiro.
Mais que isso, me banhava com sua vontade religiosa que eu insistia em rechaçar, mas que nunca recriminava, porque cada um tem suas escolhas. Sou apaixonado por seus erros de português, que eram tão seus: andar de helecópetero e ir ao cabelelero. Eu que não me atrevia a corrigir, o papel aceita tudo, dizem, mas a palavra falada é mais bonita.
Sinto falta do frango cozido aos domingos, da carninha apertada na hora do almoço. Sinto falta até do café requentado junto com a água do novo, que você teimava em me dizer que não era. Mas nunca me enganava.
Mesmo que eu quisesse ter mais tempo contigo, sei que foi melhor assim. Você não merecia o que se passou, apesar das escolhas que fez, e eu peço desculpas por não ter insistido mais, lhe incomodado mais.
Infelizmente, uns e outros somente lhe viam como uma fonte infinita de oportunidades, mas não como uma pessoa de vontades, que viajou o mundo e não entrou nas pirâmides de Gizé porque ficou com medo.
Mas… Você não está mais aqui, há meses que não estás mais aqui. E eu demorei a lhe escrever porque não tinha processado isso ainda. Pode parecer insensível que não fui me despedir de ti, mas eu não queria lhe ver de outro jeito, senão como na foto que deixo nesse fim.
Adeus, e muito obrigado.
